Astor, Egle y Lalo

Eduardo Palacios, o Lalo, era administrador de fazendas em Corrientes, marido de Egle Martin, atriz e cantora portenha. O pedinte (que pela cara de pau poderia perfeitamente fazer parte da redação do HZ) era Astor Piazzolla, então com 45 anos e recém-separado de sua primeira mulher.

Como se não bastasse, o pedido foi acompanhado por uma exposição de motivos: “Porque ella es la música, ella es música, ella necesita estar con la música, que soy yo. Porque vos no le podés dar lo que yo le puedo dar”.

A partir daí, as versões divergem. Os coleguinhas abutres disseram que Lalo, revólver à mão, arrastou Egle à casa da fazenda em Corrientes, onde ela ficou presa atrás de grades. Os coleguinhas DJs tocavam diariamente nas rádios “Graciela Oscura” (“la canción ‘de ellos'”). A versão de Egle é mais simples: diante do pedido, olhou para Lalo “y yo le dije, en un arranque de ser humano, señora, ama de casa, mujer, madre de hijos, le dije: ‘Me voy con vos'”.

O fato é que o rolo de Piazzolla com Egle vinha de quatro anos antes. Então com 24 anos, convencera o maestro a fazer uma música para um poema de Ulyses Petit de Murat, que seria usada no filme de Daniel Tinayre “Extraña Ternura”, em que ela atuava. Em 1967, eles gravaram um compacto duplo (EP para você que tem menos de 30), com a música “Graciela Oscura”, que acabou fazendo mais sucesso do que o filme.

Na época do insólito pedido, Egle e Astor estavam trabalhando na opereta María de Buenos Aires, idéia dela, música dele e libreto de Horacio Ferrer.

O principal papel, destinado a Egle, ficou vago, até o dia em que o pianista Osvaldo Tarantino chamou os dois para ouvir uma jovem cantora folclórica, em início de carreira – ela mesma, Amelita Baltar, e outro dia eu conto uma história com ela em BAires.

Vamos voltar ao compacto de 1967. Lançado pela Philips em outubro, trazia quatro músicas: “Las Rosas Golondrinas” e a já mencionada “Graciela Oscura”, ambas cantadas por Egle, e “Retrato de Mi Mesmo” (posteriormente rebatizada de “Retrato de Milton”, o Nascimento mesmo) e “Verano Porteño”, só com o quinteto. O disco sumiu e nunca foi relançado em CD.

Até agora, quando você, querido leitor do Zeno, pode ouvir as quatro faixas e ficar espiando pra capinha com o retrato da Egle, pensando se o maestro era doido mesmo ou muito esperto.